quinta-feira, 3 de junho de 2010

Uma Carta; Longa E Linda

Carta para o Chico Buarque
                       (José Danon)


Chico, você foi, é e será sempre meu herói. Pelo que você foi, pelo que você é e pelo que creio que continuará sendo. Por isso mesmo, ao ver você declarar que vai votar no Lula “por falta de opção”, tomei a liberdade de lhe apresentar o que, na opinião do seu mais devoto e incondicional admirador, pode ser uma opção.

Eu também votei no Lula contra o Collor. Tanto pelo que representava o Lula como pelo que representava o Collor. Eu também acreditava no Lula. E até aprendi várias coisas com ele, como citar ditos da mãe. Minha mãe costumava lembrar a piada do bêbado que contava como se tinha machucado tanto. Cambaleante, ele explicava: “Eu vi dois touros e duas árvores, os que eram e os que não eram. Corri e subi na árvore que não era, aí veio o touro que era e me pegou.” Acho que nós votamos no Lula que não era, aí veio o Lula que era e nos pegou.

Chico, meu mestre, acho que nós, na nossa idade, fizemos a nossa parte. Se a fizemos bem feita ou mal feita, já é uma outra história. Quando a fizemos, acreditávamos que era a correta. Mas desconfio que nossa geração não foi tão bem-sucedida, afinal. Menos em função dos valores que temos defendido e mais em razão dos resultados que temos obtido. Creio que hoje nossa principal função será a de disseminar a mensagem adequada aos jovens que vão gerenciar o mundo a partir de agora. Eles que façam mais e melhor do que fizemos, principalmente porque o que deixamos para eles não foi grande coisa. Deixamos um governo que tem o cinismo de olimpicamente perdoar os “companheiros que erraram” quando a corrupção é descoberta.

Desculpe, senhor, acho que não entendi. Como é, mesmo? Erraram? Ora, Chico. O erro é uma falha acidental, involuntária, uma tentativa frustrada ou malsucedida de acertar. Podemos dizer que errou o Parreira na estratégia de jogo, que erramos nós ao votarmos no Lula, mas não que tenham errado os zésdirceus, os marcosvalérios, os genoinos, dudas, gushikens, waldomiros, delúbios, paloccis, okamottos, adalbertos das cuecas, lulinhas, beneditasdasilva, burattis, professoresluizinhos, silvinhos, joãopaulocunhas, berzoinis, hamiltonlacerdas, lorenzettis, bargas, expeditovelosos, vedoins, freuds e mais uma centena de exemplares dessa espécie tão abundante, desafortunadamente tão preservada do risco de extinção por seu tratador. Esses não erraram. Cometeram crimes. Não são desatentos ou equivocados. São criminosos. Não merecem carinho e consolo, merecem cadeia.

Obviamente, não perguntarei se você se lembra da ditadura militar. Mas perguntarei se você não tem uma sensação de déjà vu nos rompantes de nosso presidente, na prepotência dos companheiros, na irritação com a imprensa quando a notícia não é a favor. Não é exagero, pergunte ao Larry Rother do New York Times, que, a propósito, não havia publicado nenhuma mentira. Nem mesmo o Bush, com sua peculiar e texana soberba, tem ousado ameaçar jornalistas por publicarem o que quer que seja. Pergunte ao Michael Moore. E olhe que, no caso do Bush, fazem mais que simples e despretensiosas alusões aos seus hábitos ou preferências alcoólicas no happy hour do expediente.

Mas devo concordar plenamente com o Lula ao menos numa questão em especial: quando acusa a elite de ameaçá-lo, ele tem razão. Explica o Aurélio Buarque de Hollanda que elite, do francês élite, significa “o que há de melhor em uma sociedade, minoria prestigiada, constituída pelos indivíduos mais aptos”. Poxa! Na mosca. Ele sabe que seus inimigos são as pessoas do povo mais informadas, com capacidade de análise, com condições de avaliar a eficiência e honestidade de suas ações. E não seria a primeira vez que essa mesma elite faz esse serviço. Essa elite lutou pela independência do Brasil, pela República, pelo fim da ditadura, pelas diretas-já, pela defenestração do Collor e até mesmo para tirar o Lula das grades da ditadura em 1980, onde passou 31 dias. Mas ela é a inimiga de hoje. E eu acho que é justamente aí que nós entramos.

Nós, que neste país tivemos o privilégio de aprender a ler, de comer diariamente, de ter pais dispostos a se sacrificar para que pudéssemos ser capazes de pensar com independência, como é próprio das elites - o que, a propósito, não considero uma ofensa -, não deveríamos deixar como herança para os mais jovens presentes de grego como Lula, Chávez, Evo Morales, Fidel - herói do Lula, que fuzila os insatisfeitos que tentam desesperadamente escapar de sua “democracia”. Nossa herança deveria ser a experiência que acumulamos como justo castigo por admitirmos passivamente ser governados pelo Lula, pelo Chávez, pelo Evo e pelo Fidel, juntamente com a sabedoria de poder fazer dessa experiência um antídoto para esse globalizado veneno. Nossa melhor herança será o sinal que deixaremos para quem vem depois, um claro sinal de que permanentemente apoiaremos a ética e a honestidade e repudiaremos o contrário disto. Da mesma forma que elegemos o bom, destronamos o ruim, mesmo que o bom e o ruim sejam representados pela mesma pessoa em tempos distintos.

Assim como o maior mal que a inflação causa é o da supressão da referência dos parâmetros do valor material das coisas, o maior mal que a impunidade causa é o da perda de referência dos parâmetros de justiça social. Aceitar passivamente a livre ação do desonesto é ser cúmplice do bandido, condenando a vítima a pagar pelo malfeito. Temos opção. A opção é destronar o ruim. Se o oposto será bom, veremos depois. Se o oposto tampouco servir, também o destronaremos. A nossa tolerância zero contra a sacanagem evitará que as passagens importantes de nossa História, nesse sanatório geral, terminem por desbotar-se na memória de nossas novas gerações.

Aí, sim, Chico, acho que cada paralelepípedo da velha cidade, no dia 1º de outubro, vai se arrepiar.

Seu admirador número 1,
Zé Danon


José Danon é economista e
consultor de empresas

13 comentários:



  1. As vezes tenho a sensação de que,
    meus heróis (nossos) nos traíram...

    Será que sempre será assim?!

    Eu continuo (teimo) a esperar
    o salvador desta PÁTRIA!

    Lá pela gLOBO acham que são
    os Filipe Massa, Robinhos/Rubinhos, Dunga
    ou as Ivetes Sangalo da vida!

    Será que um dia ELE vem
    ou DEU-Se o que tinha que DAR-se?

    Abra(cora)çoes!

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  2. Na verdade, penso o seguinte:
    se duas pessoas são diferentes entre si, imagine a diferença exponencial que encontramos dentro de um país como o nosso.

    Outra coisa: pessoas que poderíamos considerar de elite (a definição está no post), consideram esse governo com seu partido e presidente juntos, uma graça! Um must!!!!!!!!

    O que podemos fazer??? me diga!
    Picas?
    Mais ou menos...
    Deve haver alguem por aí...
    De minha parte, vou tentar..., ou melhor, vou votar na Marina. Talvez não entre, mas, votar no que está aí eu me recuso.

    Tá danado...

    Abrções!

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  3. Pertinente post...são palavras que grande parcela de pessoas deste país gostaria de expressar e tão bem expostas aqui!! Compartilho com você as mesmas idéias que você colocou no comentário...em quem votar? Não temos alternativa...O PV que vende sua sigla para qualquer político associar-se aos "pricncípios" do partido! creio, não merecer nossa confiança! Mereceriam um massacrante "NULO" nas eleições, mostrar nossa insatisfação aos que estão no poder! Sei que isso é utópico..mas reflexionando sobre o texto do Blog..nós que estamos aqui ainda podemos fazer algo...e não apenas esperar que futuras gerações mudem esse país...senão, corre-se o risco de perpertuar as mesmas "histórias" que é nos contadas todos os dias nas TVs!
    Necessita um "Oposto" de tudo que tem hoje!


    Sylvio, obrigado pelo comentário em meu Blog!

    Abraços,

    Paulo Zerbato

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  4. Vinda longa à lucidez e escritos como este..


    Ester
    ~*~

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  5. Qto ao bebado, qcho q posso aplica-lo a quase tudo,
    me apaixonei pelo que não era, fui traida pelo q era
    prestei o vestibular que não era, fui atingida pela que era
    comprei a bolsa que não era, paguei o preço da que era.

    rs.
    brinquei um pouquinho,
    mas sabe,
    ameio texto.

    um Bjão

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  6. Paulo
    Na verdade, do ponto de vista do governo e simpatizantes, esse post é impertinente e mentiroso! Para eles (e elas), esse cara é um terrorista, um desestabilizador de regimes!
    Um... salafrário descontente!

    Não pretendo votar em partido... Votarei numa PESSOA!
    Em última analise, é ela que decidirá os rumos da bagaça (hoje é o que somos).

    Esse fazer 'algo' é?: VOTAR!
    Ou, matar uns 10 ou 15...
    Não quero um 'Oposto', ou 'Oposta', quero uma cabeça 'Livre'! só assim teremos uma chance do 'Novo'!

    De nada, Paulitcho!
    Altas gravuras! Vc é fera!

    Abrçs!

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  7. 'me apaixonei pelo que não era, fui traida pelo q era
    prestei o vestibular que não era, fui atingida pela que era
    comprei a bolsa que não era, paguei o preço da que era.'

    Se não abrirmos o olho... Quer dizer: mesmo abrindo, levamos uns coices.
    Hay que abrir nosotros a nuestras cabezas, también!

    Béson!

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  8. Sylvio,

    Quando escrevi "Algo", pensei (ingênuamente) em uma mobilização de pessoas que tenham visão política "oposta" a tudo que tem igual ou similar a esta "cambada" que está instalada(e bem instalada)hoje, em todos os setores políticos deste país! É essa cabeça"Livre" que pensei mas não expressei corretamente!
    E sobre a Marina! Também não voto em "partidos políticos", mas citei o "causo" da venda do PV para ilustrar que a Base Política ou a "Ideologia" que ela representa já está manchada (aliás com dinheiro..rsrs (só para cutucar mais!). Nada contra/consta a pessoa Marina, até sou simpatizante, mas partido e candidato dependem um do outro...(não querendo ser pessimista!)

    Abraços,

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  9. Paulo
    Vc se expressou muito bem. Em tudo.

    Eu é que saio destrambelhado comentando tudo.

    Quanto aos partidos, parece que nenhum se salva... Eu sei, me contam casos de dirigentes do PV tendo que sair armados.

    Uma candidata tem que ter um partido, né?
    Uma pena, mas é real a coisa.

    Tivemos muitos anos para nos mobilizar; esse papo, na minha opnião, já É uma mobilização. Somos uma base para a vinda de uma nova percepção política.
    Sei lá né, eu acho... Alguma coisa temos que ser...

    Entendi. Vc não está sendo pessimista..., ninguém governa sózinho.
    Quanto a grana, num sei; nada posso falar; mas também não duvido.

    Na verade, quem pode levar o caneco é o Serra. Ou, a dilma. Pra quem viu o povo dar 8 anos pro Inacio..., acho que qualquer bosta pode acontecer.

    Abrçs brother.
    Valeu!

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